Os compositores são pessoas que têm uma missão de traduzir em canções a própria vida. Na história da Música, diversos autores retrataram o dia-a-dia, os costumes, o modo de viver, os acontecimentos do seu tempo e da sua sociedade. O poeta é aquele que vê o que todos vêem, mas de maneira diferente. Os seus olhos conseguem enxergar além dos problemas, dos fatos, da história.
Quem compõe letras e melodias (assim como todo e qualquer artista, na especificidade de sua arte) é responsável pela expressão de um povo, de uma cultura. É um cronista do seu tempo. Daí a responsabilidade de quem se dispõe a transformar suas experiências em canções que vão embalar as experiências de vida de outras pessoas.
Ao longo da história do Brasil, a Música Popular Brasileira exerceu uma função contestadora e produtora de uma nova mentalidade. Durante o período da Ditadura Militar, por exemplo, muitos compositores, em meio às investigações do Dops e à ação da censura, conseguiam despistar os censores. Através da poesia e da melodia, denunciavam a tirania dos militares, utilizando-se de linguagem simbólica.
Na história do povo de Deus, os salmistas também conseguiam traduzir as dores e esperanças pessoais e comunitárias, denunciar injustiças e elevar clamores ao Criador através do texto musicado. As Sagradas Escrituras contam que o canto de Davi (a quem são atribuídas as composições de diversos salmos) acalmava a alma do rei Saul.
Observando essas duas características, dá para se ter uma idéia da tamanha responsabilidade que o compositor cristão tem diante do seu ministério e da sua Igreja. Não é apenas uma responsabilidade de quem expressa seus sentimentos ou experiências, mas de quem expressa, em suas canções, o que Deus quer falar para o seu povo. O compositor católico precisa estar muito atento ao que o Senhor suscita e transformar isso em poema e melodia, permanecendo fiel à essência da mensagem divina. Por isso, quem se propõe a compor precisar ter diversos cuidados para que a sua música, ao invés de aproximar, não afaste as pessoas da condução de Deus.
Um primeiro cuidado que o compositor precisa ter é estar bem informado a respeito da opinião da Igreja sobre os assuntos em discussão na sociedade, conhecer a doutrina, prestar atenção nos pronunciamentos do Papa, enfim, é preciso estar atento para que as letras expressem aquilo que realmente é a realidade da Igreja. É preciso ter muito cuidado para não produzir letras vazias, que não dizem nada, que dizem da mesma maneira que muitos outros já disseram ou que fogem dos ensinamentos da Igreja Católica.
Claro que há espaço para músicas de animação, de dinâmica, mas penso que o compositor deve, mesmo na mais simples das canções, dizer algo que faça as pessoas pararem para refletir sobre suas vidas. Nossas letras têm sempre que trazer uma frase, uma palavra, que leve o homem a se questionar, a cair em si e, assim como o filho pródigo da parábola, tomar uma decisão. A música precisa trazer, de forma inteligente e cativante, a novidade e, principalmente, a verdade do Evangelho.
Considerando que os ministros de música precisam ser antes de tudo profetas, as canções que são interpretadas por esses ministérios também devem ser proféticas. Daí vem uma segunda preocupação que todo compositor cristão deve ter: estar em constante estado de oração e adoração.
Não há como saber o que Deus quer falar para o seu povo sem estar com o Senhor. Não há como colocar a inteligência e a sensibilidade artística a serviço dele sem submeter-lhe toda a vida. Quem ora, compõe! Quem vive as experiências da vida, colhendo os ensinamentos de Deus, tem matéria prima abundante para suas composições. Sem isso, a pessoa pode até juntar palavras bonitas e colocar ritmos e melodias interessantes, mas suas músicas serão repetitivas, porque o novo surge a cada dia, mas é preciso estar mergulhado em Deus para encontrá-lo.
No meio secular, nós vemos músicas e músicas. Algumas são tão profundas que perpassam gerações e nunca deixam de cumprir a sua missão de mover o coração humano para uma atitude interior (e por vezes exterior) diante da vida. Porém, temos visto também o surgimento de algumas músicas vazias, imbecilizantes, feitas só para agradar interesses imediatos, cujas letras não dizem nada. Essas canções (se é que podem ser chamadas assim) são geralmente repetitivas, e de fácil assimilação, justamente para atender aos interesses do mercado. Esse é um risco que a música católica e cristã, de um modo geral, corre quando enxerga a produção de CDs e o lançamento de novos cantores e bandas apenas como uma segmentação de mercado, um negócio, e não como um chamado de Deus.
Mas uma música que fala de Deus pode ser imbecilizante? Pode. Se ela privilegiar apenas o consumo, em detrimento da sua função maior, que é ser profética, e se não levar as pessoas a questionarem a sua vida de fé.
Esse risco não está, necessariamente, relacionado à diversidade de ritmos e estilos musicais. Qualquer ritmo é bem-vindo, desde que traduza a linguagem e a expressão de Deus para com o seu povo, leve os homens a celebrar a presença do Senhor em suas vidas e, como diz Santo Agostinho, os faça orar duas vezes.
A música é viva e produz fruto quando ela expressa a nossa intimidade pessoal com Cristo, quando ela surge de uma fé vivida no dia-a-dia, no trabalho, na família, na vivência paroquial, na experiência concreta do Deus Conosco. Precisamos de letras e melodias que, de forma criativa, nos façam pensar, alegrem o nosso coração, nos encham de esperança, nos catequizem, nos evangelizem, nos formem, nos informem, suscitem o desejo pela oração, elevem a nossa alma ao coração de Deus.
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